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And the oscar goes to...

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O tempo passa por nós, muitas vezes como um tapete voador que nos retira de um lugar e nos leva para outro, sem que sequer cheguemos a dar por isso. Os caracóis da idade da inocência caíram, algumas rugas adensaram-se à beira do precipício do olhos e do sorriso (por vezes até da testa), e a pele, antes resistente a qualquer intempérie, agora texturiza-se de manchas e de grossas olheiras com a falta de tempo, os trabalhos que ainda estão na cabeça e os outros que já estão a ser feitos ou já deviam ser entregues... enfim, a entrada a pés juntos na vida adulta. Em resumo, o brilho dos olhos tornou-se um pouco mais baço: já não se sonha tanto com o príncipe encantado, a banda favorita ou o bife com natas, mas fantasia-se antes com uma casa a que possamos chamar nossa, um emprego estável e de que gostemos, e dinheiro ganho por nós, para uma refeição garantida. Enfim, crescer... Mas não escrevo para falar das coisas más que se adquirem, ou da suposta "crise" de que todos falam. Esc...

Lugar. Cor.

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Abre-se a porta e descobre-se qual é a sensação de nos embrenharmos na escuridão: olhar para a frente e parecer que nos estamos a ver de cima, a desaparecer no meio das sombras, a perder o contraste com a noite de repente, acabados de sair dum seio de luzes artificiais. E no entanto, tudo é mesmo tão artificial, que parece haver algum alívio quando deixamos de conseguir ver-nos a nós mesmos. Conforto-me cantando. Porque nada mais preenche. Parece haver um vazio, a que nada nem ninguém consegue dar cor nem significado. E ao escrever isto apercebo-me do chavão. Mas só agora o peso destas palavras me caiu sobre as costas. Só agora nos medimos mano a mano. Há um vazio. Mas não há uma razão. A casa não está vazia de móveis, nem de cores, nem de coisas minhas, que amo e desejo cuidar. Simplesmente não consigo focá-las, identificá-las, mover-me para as cuidar. Acontece que nos carregamos, sem saber para onde. À procura de uma porta em que nos faça sentido entrar. Em que pareça que vemos refle...

Abraço. Lugar

As pontas dos dedos geladas, desistentes a meio dos gestos. O sorriso embaraçado de quem conversa em silêncio na escuridão. Esperam a palavra do outro. O corpo rígido e os punhos fechados, ao mesmo tempo frio e insegurança. Levanta a cabeça, encarando o céu de baixo, com os seus olhos verdes a brilharem, perdidos nas estrelas. Segura um cigarro amachucado no centro da boca, e uma espiral e fumo e vapor desenrola-se à frente da sua boca quando expele um bafo do vício para o ar, segurando o cigarro entre os dedos. Desfaz-se como uma nuvem difícil e certa, em direcção ao céu que os cobre. Parece um prenúncio de algo que vislumbraram na noite passada, quando ele a acariciou em segredo enquanto dormia. Um gesto que ele não controlou, e que ela não impediu. E que no dia seguinte parecia ter-se esfumado, quando eles evitavam olhar-se nos olhos. Não sabiam o que tinha acontecido: apenas que esse toque fora irresistível, tão irresistível como inesquecível. A sua boca ficara a milímetros da dela...

Ano Novo, wicahpi em restauração

Após cuidadoso balanço, foi decidido que a wicahpi precisa de fazer restaurações na alma. Coisas pequenas mas que vão fazer a diferença. Porque em Novo Ano, sonha-se sempre com uma vida nova, ou pelo menos com umas pinceladas de cor mais viva nela. Porque quando olhamos para a nossa história, queremos ver que sem dúvida é nossa, que não podia ser de mais ninguém... Pinceladas: * Escrever mais, e fazer uma colectânea de textos para pensar em ir bater à porta de umas editoras, nunca se sabe... * Esforçar-me mais para estudar (esta repete-se desde quê?, dos meus 16 anos, mas ok) * Passar mais tempo com a família, que está também num momento de restauração * Tirar mais tempo para mim, sozinha, sem mais ninguém, para recuperar alguma paz interior * Fazer exercício físico, para não chegar às férias e andar de gola alta e calças largas * Batalhar nesse grande monstro que é a minha falta de auto-estima * Deixar de roer as unhas (outra que se repete desde sempre, mas é desta, é desta!!) * Aplic...

I do not love you...

"Eu não te amo como se fosses uma rosa de sal, ou um topázio (...) Eu amo-te da forma como certas coisas obscuras devem ser amadas, Em segredo, entre a sombra e a alma. Eu amo-te como a planta que nunca floresce, Mas que carrega consigo a luz de flores escondidas. (...) Eu amo-te sem saber como, ou quando, ou de onde, (...) Eu amo-te desta maneira, Porque não conheço outra maneira de amar A não ser esta, em que não há eu nem tu, Tão íntima que a tua mão no meu peito é a minha mão, Tão íntima... que quando eu adormeço, São os teus olhos que se fecham." Pablo Neruda

Imagens de um desejo

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Pequenos pedaços, fragmentos de eu. Numa turbulenta madrugada se soltarão, em gritos de prazer, em gargalhadas sonoras, olhares derretidos, madeixas de cabelo soltas sobre costas nuas, palavras de amor e reconciliação. De paz. Depois do sonho concretizado. Um sonho escondido, tímido e bem guardado, com medo do olhar alheio. Um palco. Uma voz sozinha, como uma alma à janela. A encher a sala. E por uma vez. A primeira vez. É encanto. Como um beijo profundo, a parte que entra dentro de nós e nos faz respirar fundo. Essa parte do beijo. Essa parte que abalroa e nos preenche, nos enche de cor. Ouvir uma voz tão bonita que não se contêm as lágrimas. Mas uma sala inteira sentir isto... é obra. É um dom. É magia. E sentir nos olhos dos outros, que vêem essa magia em nós... É só isso...

Infância

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Numa dessas tardes bem londrinas, em que os vidros do carro mais parecem faces de carpideiras, brilhantes e pingadas, e o céu parece ter sido sempre cinzento, aventurei-me pelo meio das luzes nubladas até ao meu bairro de infância. Teimei em passar naquela que é um pouquinho a minha pastelaria, por estar mesmo a precisar de um sabor do antigamente para me aquecer por dentro... Entro, e perante os olhares dos amigos percebo que enalteci demasiado o lugar: a grande pastelaria de que sempre falei à boca cheia não passa mesmo de um café de bairro, em aspecto e distinção. Com o talhante ainda de "farda" de fim de dia a beber um copo ao balcão, e a velhota de carrapito desmontado a beber um chá e a comer o seu bolito. Apercebo-me de que até para mim a pastelaria parece de repente mais pequena, mais escura e menos... especial. Imagino que na minha fantasia o café devia ser colorido e cheio de pessoas felizes, pois é assim que uma criança com uma infância feliz vê normalmente a vida....