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Pequena coisa. Coisa pequena.

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Em cada um dos teus dias tem de haver uma coisa, pelo menos uma coisinha pequenina, que seja boa. Acredita. Apenas ainda não reparaste. E pode não apagar todas as menos boas e as terríveis que por ti passam, nesse mesmo dia. Mas não te deixes enganar. O tamanho não está apenas nas coisas, mas também na mão que as agarra. Será que a encaras como uma perda de tempo (sim, essa coisa boa de que falei), como uma poeira própria de microscópio, ou será que és capaz de algo muito mais difícil e desafiante - deixar-te levar pela curiosidade de descobrir o quão grande essa coisa pode ser, dentro de ti? Não ouso dizer que descobri a cura para todos os males, nem a estratégia certa para todos os dias. Mas na maior parte dos dias corremos; estabelecemos metas e deixamo-nos apanhar sobretudo pelas tarefas e deveres (têm de vir primeiro). Não sobra tempo para as casualidades, para os pormenores e para as sortes dentro dos percalços. Às vezes dura o tempo de uma respiração. Estás atento? Hoje ...

Dias cá. dias lá.

Há dias em que consigo viver esquecendo-me que existes. Como se não povoasses ainda memórias, sonhos, passos. Há fases em que o faço gloriosamente; viver sem ti. Dias em que sou capaz de contar várias razões para estar só. Razões para continuar a ter esperança no dia de amanhã, num caminho aberto à minha frente. Dias em que recordo como vim parar aqui. Em que sou capaz de olhar em volta e contar várias bençãos, sentir-me grata, respirar fundo e continuar. Há dias em que sei que tem de ser. Há dias em que não faz mal. Em que não dói. Mas depois há dias como o de hoje. Há dias em que tenho de morder valentemente os lábios para me impedir de te chamar.

Em caso de dúvida, levante o braço.

Em tempos de confusão e dúvida, siga em frente. Sempre que as apitadelas forem mais do que muitas, e lhe der a sensação de que pode estar a fazer algo errado, pare. Encoste a uma berma assim que possível, e respire fundo. Se possível, fique mesmo por aí, e volte a pegar no carro apenas no dia seguinte. E se precisar de ajuda, vá lá, não seja assim... levante o braço. Não se esqueça de fazer algo que lhe dê muito prazer, todos os dias. Seja só um café, sejam três páginas do novo romance do seu autor favorito, ou algo mais pecaminoso, ou até mais vulgar (como o romance do seu quinto autor favorito, que encontrou em promoção no supermercado). Não importa, na verdade, a natureza da coisa em questão. Importa só o prazer que esta lhe dá. Não desista de se oferecer, diariamente, um bocadinho de consolo. Se for mais do que um pedacinho, melhor. É esse pedacinho de si que vai alimentar todos os outros. É esse lugar de si, agora acariciado, que vai criar espaço para os outros, os que precisam...

Caixas vazias.

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Há dias em que podíamos ser caixas vazias. Todos nós temos dias sem interior, sem presença. Mas outros dias há, em que a caixa está cheia. Diferentes objectos se nos revelam e nos preenchem, de formas diferentes e bonitas. E o que nos leva lá, a cada um de nós, é a nossa capacidade tola de continuar a sonhar. A minha ponte? O meu objecto? O amor. Sim, ainda acredito. Ainda vejo, numa linha mais lá ao fundo, a minha mão suportada por outra, forte, constante. Oiço uma gargalhada sobre a minha, dando força uma à outra, mutuamente.  A par de todas as imperfeições, de todas as resmunguices, a minha mão estende-se para a sua face, lembrando-se da ternura nas horas mais imprevisíveis. A minha voz desafinada enche a sala, e há alguém que me ouve sorrindo. Com isso sentindo-se confortado. O meu coração enche-se ao ser surpreendida com um beijo. Quando acordo sabendo que um abraço é o meu lugar seguro, em dias de chuva, de poeira, de assim-assim. Muito disto não será como imaginei. ...

Sentada no telhado.

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Soube logo que só ia saber fazer isto. Desde o primeiro caderno que me foi oferecido, há tantos, tantos anos. Nunca lhe encontrei melhor propósito do que para empilhar letras. Excepto, claro, quando perdia a paciência para procurar as palavras certas para os tumultos em questão (era uma jovem adolescente). Nestes casos, acabava rabiscando as minhas desarrumações nas margens, para deixar sair a pressão para qualquer lado. Na altura, quase só me saíam poemas de amor - maus, lamechas, desajeitados como tudo. Eram as histórias que eu tinha para contar. Lembro-me desse caderno como se estivesse à minha frente, e até ver ainda o guardo; azul escuro, de papel reciclado, com um buraco na capa onde desenhei, vá-se lá saber porquê, um pé (que só eu sei dizer que é um pé, e apenas porque fui eu que o desenhei). Escrever era, já na altura, como sentar-me num telhado. E deixar o olhar perder-se, até que encontrasse algo em que valesse a pena prender-se. Ora aí está. Antes disso já escrev...

No lugar.

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É isso. Só isso. Agarra-te com força ao que te inquieta - mãos arqueadas, braços seguros. Ocupa-te de saber o que te move, o que te faz borbulhar. Assegura-te de que cada músculo conhece o seu lugar, e mantém um sorriso na cara. Entrega-te ao momento. Quando for hora de saltar, empurra o chão com toda a força. E se puderes, guarda alguma delicadeza dentro de ti. Não te deixes partir pela força que te pede o salto. Os nossos movimentos só ganham em elegância e beleza. Fotografia: Caroline Pav

Vai e beija o mar por mim

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Ela foi e pediu-lhe. "Beija o mar por mim." Nunca mais poderia voltar ao mar. Não àquele; não àquela praia. Que tristeza tamanha. Deparava-se com uma imensidão de nada, de vazio. No peito gritava uma sensação de injustiça. Não poder tornar a uma casa onde se foi tão feliz. Onde nos redescobrimos, onde fizemos outros felizes. Como quem fez algo de errado. A frustração de saber como é raro sentir assim. Aqueles instantes que queremos agarrar para nunca largar, "é isto mesmo", "estou no sítio certo", "quem me dera que nunca acabasse". E depois ter de largar tudo; pegar fogo ao que se construiu, ao que se foi; ter de fugir e começar de novo. Um dia houve medo. Medo de nunca mais conseguir ordenar aos dedos que se juntassem em equipa para escrever. Por momentos pareciam ter deixado de lhe dar ouvidos. Medo de ser agora irremediavelmente incompleta. Medo do seu coração, que enfim revele ter passado a ser de pedra; sem sonhos, sem calor, apen...