Sentir.

Hoje levantei-me e estava calor.
Há vários dias que o calor não amaina; as paredes não arrefecem, o corpo não tem sossego. Tomam-se dois e três banhos num dia, para tentar aplacar esta inquietação.

Tudo está demasiado quente: a sopa está quente; o computador está quente; a casa está quente; a rua, a roupa, o corpo - que irritação, sentir que tudo está quente.
E lá vamos nós, na nossa agitação, reclamando pelo caminho, no meio do trânsito; reclamando das pessoas com quem temos de falar, ou daquelas que não falam connosco. Passamos o dedo pelo telemóvel e verificamos "gostos" em publicações, como se verificássemos abraços ou carinhos. É difícil sentirmo-nos gratos, com a pressa dos dias. Não nos confortamos com o rumo que o dia está a levar, ou mesmo os dias em geral. Sobra-nos pouco, pelas nossas contas. Queríamos mais.

E depois há pessoas que acordaram num dia como estes, nossos, sem saberem como é que ele iria acabar. Sem saberem que seria o último carinho, a última reclamação, o último minuto. Sem saberem que não haveria mais para querer, no dia a seguir. Porque não haveriam mais dias.

Que irritação, poder sentir.

Somos tão pequeninos. Tão esquecidinhos. A vida é um aqui e agora, por enquanto. E de vez em quando, quando já andamos embrulhados nisto tudo que importa tão pouco - o antes, o se calhar, o talvez e o depois - lá somos sacudidos e postos no lugar. Se tivermos a sorte de continuar a sentir.

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