A carta do até já.

Foi na noite de 12 de Fevereiro de 2016. Estava um daqueles dias em que a chuva não se descolava dos céus, em que as nuvens não se cansavam de chorar. Até o tecto da sala chorava. O Benfica perdia a duas bolas contra uma para o Porto, os comentários sucediam-se nas redes sociais; picardias, maus perderes, regozijos pouco fundamentados. Estávamos longe disso, tu e eu, entregues a uma tarefa muito mais humana. Foi nessa noite que decidimos, tu e eu, deixar doer.

Foi mágica, a maneira como chegámos aqui. Agradecemos um ao outro. Desabafámos os nossos medos, as inseguranças que nos arrepanhavam nos últimos tempos. Rimos de coisas boas que partilhámos, fizemos caricaturas do que está para vir. Acho que não podia ter havido mais paz naquilo que fizemos. Mas houve, sem dúvida alguma, o rebentar de uma nascente de dor.

Sabes o que me irrita? É que só agora, com esta dor inacreditável a escorrer-me do peito em ondas, é que consigo ver as coisas com uma clareza em alta definição - quase em Blu-ray. Com a clareza que faltou nestes últimos meses. Foi assim que parámos no tempo e, sem dar por isso, nos afastámos um do outro.

Perguntas tu: o que vês, agora que as coisas se vão mostrando mais nítidas?

É que os problemas, que até ontem eram difíceis, que me faziam refilar contigo, que me traziam frustração - neste momento parecem ter uma raiz, uma origem e uma intensidade diferentes. Parecem pequeninos e com solução, quando postos ombro a ombro com a perspectiva de perder este meu companheiro.

Sabes o que eu queria? Que quisesses viver comigo. E que voltasses a sentir alguma paixão. Mas eu sei que essa mudança só pode acontecer de mãos dadas com uma mudança minha - eu tenho de fazer mais do que me faz sentido, independentemente de ti. E daí a minha esperança. Explico-te o meu raciocínio: se eu estiver sem ti, vou dedicar-me a mim. Vou pôr a minha energia em fazer as coisas de que gosto, e habituar-me a fazê-lo (e tu o mesmo). Ao voltar a estar contigo, esses hábitos vão levar-nos a ter mais espaço individual - talvez aquilo de que mais precisavas. E acredito que, ao teres esse espaço, vais desejar passar mais tempo de qualidade comigo - não é estar mais tempo, mas o tempo que tivermos vai ser melhor. Vamos estar mais felizes juntos, e vamos desfrutar desta nossa cumplicidade sem igual.
Mas neste momento, a chama está apagada. O investimento que fazíamos ultimamente no "nós" era quase nulo. Não vai ser possível investir no "nós" sem investir primeiro no "tu" e "eu".

Compreendes agora a minha esperança?

Não estou a dizer que sei com certeza que voltaremos a este lugar. Acho que o espaço e o tempo que decidimos dar-nos, são essenciais. E não podemos, de forma alguma, voltar ao que tivemos. Teria de ser, sempre e apenas, um humilde recomeço.

A paixão não tem estado à vista, mas eu sinto que ela não morreu. Acredito que a distância e o espaço nos vão recordar que as borboletas ainda estão lá, dentro da barriga, à espera de se agitarem com saudades e com amor.

Sei que somos diferentes. Somos mesmo. Mas também reconheço em nós uma equipa que muitos casais, ainda que mais semelhantes entre si, não conseguem construir. Porque isto sim: ou se tem, ou não se tem. Não se trata do já conhecido "não consigo viver sem ti"; trata-se de um muito mais real "eu sei que conseguia viver sem ti, mas escolho viver contigo".

E é essa a minha leitura principal do que tem falhado: deixámos de escolher viver juntos todos os dias, porque era mais importante focarmo-nos em nós próprios, mas não estávamos a conseguir fazê-lo estando juntos. Juntámo-nos quando éramos ainda miúdos, e afadigámo-nos a cuidar desta relação, descurando o nosso crescimento individual, a nossa diversão, alguma liberdade.

Sei que agora temos de nos dar tempo. Temos de deixar que a dor nos abrace, sabendo que ela nos vai rasgar. Isto tinha de acontecer, e senti uma enorme paz quando ambos pudemos verbalizar isso.

Mas não sei ver isto como um adeus. Talvez seja para me proteger. Mas eu só consigo ver isto como um espaço e tempo para respirar, para cuidarmos de nós próprios. Vamos olhar para dentro, vamos olhar em volta, e vamos ver onde a dor nos leva.

Vamos cuidar-nos, mimar-nos, colar os bocadinhos que têm estado em falta.

Mas esta romântica totó que tu conheces tão bem, ainda acredita num final feliz... Por isso recuso-me a dizer-te "adeus". Não consigo achar que terminámos; apenas que nos afastámos. E não estou a falar do facto de ir lutar para te manter sempre na minha vida como o grande amigo que foste para mim, até aqui.  És o homem mais importante da minha vida... serei sempre tua amiga, grata por tudo o que me deste.
Estou mesmo a dizer-te que acredito que isto é um "até já" que faço ao homem que mais me ressoou como o companheiro que quero ter na vida.

Por isso olha... chora, cuida de ti, e sê feliz. E se puderes, volta.

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