O amor para as borboletas

Pensando nas borboletas, sei desde logo observar o óbvio: o amor é-lhes leve.
Esta análise cuidada tem por base um sem-número de observações das borboletas no seu estado natural, o que me eleva ao estatuto de especialista nas emoções das borboletas. Dei-me inclusivamente ao trabalho de não permitir que elas me vissem, de forma a não interferir nas suas acções.

Dizia eu então que nas suas asas de pétala de flor, cabe um mundo inteiro de sonhos - mas tem de ser um mundo leve, delicado. Ora, como todos sabemos, o amor pode ter tanto de ligeiro como de abrupto. Como explicar, então, que a fragilidade de uma borboleta seja capaz de arcar com a energia do amor?

As suas antenas captam o amor a léguas; uma borboleta pode deslocar-se quilómetros infindáveis, em busca desse travo picante que se imprime na brisa. A mesma brisa que ora lhes empurra as asas, ora lhes faz resistência ao corpo adocicado. Mas elas perseguem, incansáveis, a resposta ao seu desejo, para lá do sol posto.
Lá chegadas, não me quero demorar em pormenores gráficos; poderia eventualmente chocar-vos. É que a verdade é que o amor nem sempre é bonito; traz por vezes ao de cima facetas menos estéticas das nossas pessoas. Tal, porém, não acontece com as borboletas, que nunca perdem a pose. Assim sendo, poderia ser chocante para vós descobrir que o acto de amor das borboletas se dá entre dois pestanejares, escondido pelo bater das asas. Desafiava-vos a descobri-lo com os vossos olhos, mas precisariam de um olhar treinado como o meu.

O amor para as borboletas, é então mais fino do que lenço de papel. Elas assoam-se a ele, e o seu nariz microscópico (que eu estou em crer que elas têm, embora não se veja!) enche o papel de risinhos tontos, de sussurros e de segredos - beijados e por beijar, sentidos e por sentir.
Que o amor não é esquisito; estou em crer que ele não distingue as borboletas dos humanos. Simplesmente existe, inebria e instala-se, sem mais.
Mas as borboletas, embriagadas de amor, conduzem-se ainda mais leves; dir-se-iam acabadas de nascer, mas não é o fulgor que as toma; é uma candura maior ainda, uma elevação ao estado do quase transparente. As asas fluem em vez de bater, e o seu coração (como decerto o terão, maior do que o corpo) emana luz, em vez de palpitar.
Esta luz provoca-nos e deixa-nos a pensar. Como pode tão fina flor amar? E amar assim, como se fosse divina, enquanto nós nos vemos tantas vezes a braços com um pedregulho no lugar do coração?

Ora esta vossa humilde observadora de borboletas chegou por fim a uma conclusão. É que as borboletas vivem por vezes a vida toda num dia. No espaço de horas em que por vezes levamos a cabo uma discussão por ninharias, não nos damos entretanto conta de que houve tempo para que a luz de uma borboleta se acendesse e apagasse, sem preâmbulos. Elas são assim levadas a beijar como quem sopra, a amar como quem ri, sem pausas para respirar. No instante de um bater de asas, houve já lugar a uma história de amor.

De alguma forma elas aprenderam a absorver a loucura do amor na trepidação das suas asas. O segredo, digo eu, está nas asas.

Comentários

Indio disse…
:D Muuuuito bom!!!

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