Menino guloso

um texto de outros tempos. que de tempos a tempos, volta a fazer-se contemporâneo para alguém.

O ser humano... tanto que ele se dá a mossas e desvarios. Engana-se, desengana-se e multiplica-se em desilusões, à partida iludido com falsas soluções. Ou como dizem as avós, "taroucos", dados a "avarias". São os que eu mais adoro, os taroucos. Ou não fosse eu dada a sinas e desgraças. Gosto deles como quem pára para ver o acidente, mesmo sabendo que nada de muito bom deverá advir daí.

"És guloso. Assim te chamo dentro da minha cabeça. Queres a ginja que dorme dentro do bombom, planeando desprezar o chocolate que lhe serve de pele. Um enorme jeito de dedos, como experiente carteirista, se te requer para retirares o suco e a fruta, deixando o chocolate de aspecto imaculado. Mas na verdade, ele fica vazio; e novo toque quente de dedos iludidos em busca do todo fá-lo-á ruir.
Tonto de sede, é a magia do primeiro toque que procuras. Nessa química cheirosa que todos conhecemos, te refugias da monotonia dos dias, procurando-a outra e outra vez. Não voltas, nem te demoras o suficiente para saberes que afinal, a química pode continuar a acontecer. E em cada partida, sem saberes, deixas mais um pedaço de ti, ficando cada vez mais vazio.

Compreende-se perfeitamente, essa tua busca pelo travo doce da sedução. Os bagos silvestres da paixão. Quem é que não gosta de se esquecer da roupa e das maneiras? Satisfazer-se de supetão, manchando a boca de vermelho? Por alguns instantes, ergue-se o peito e enche-se a barriga... "Mas são rosas, senhor", e espinhos terão, desde sempre e para sempre. Quer queiras, quer não.

Por todas estas razões, comigo não contes. Prefiro que sonhes para sempre com o delírio que seria o primeiro embate comigo. Serei eu assim perfeição, pintada em vez de fotografada [em flagrante delito]. Serei bandido dos sonhos e não das ruas. E não participarei nesse saquear do pouco que ainda mora em ti.
Podes então argumentar: "assim morreremos sem saber." É verdade. Mas até lá, espero continuar a viver.

Olha que giro, já viste? Só por seres um menino guloso, puseste-me a escrever."

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