O poder de um baú

Nada como abrir o baú do modesto "enxoval" para recuperar perspectivas.
É um baú de madeira, pequeno, de tampa pesada. Está escondido no sótão, e raramente o abro. Hoje abri-o, para lhe juntar uma caixa de agulhas e alfinetes, que um dia me poderão dar um jeitão nos remendos.
Olho para as pegas que trouxe de Londres na minha viagem de finalistas; para o bule chinês com os copos de chá; para o avental que a minha avó me comprou, da sua cor favorita, amarelo.
Levanto dois panos com motivos orientais, e o quadro de prata com o Buddha talhado; desta feita, coisas que eram dos meus pais e que adornarão o meu cantinho.
Encontro o serviço de café colorido que me deu a futura "sogra"; sorrio, pensando como desejo um dia poder servir-lhe um café naquelas mesmas chávenas!
Encostado a um dos lados do baú, está um tabuleiro de plástico, com desenhos coloridos de fachadas de prédios de Paris. Imagino este tabuleiro a viajar com muitos pequenos almoços até à nossa cama... a provocar muitos sorrisos, a ser cúmplice de muitos domingos de namoro, de muitas tardes de chá com as amigas.
Lembro-me dos pequenos mimos que fomos coleccionando ao longo das nossas viagens, que pertencem aqui. E olho para os espaços vazios com um sorriso; representam as viagens que ainda havemos de fazer.
E é ali. Algures entre o conjunto de utensílios de cozinha de silicone coloridos [que a mãe foi coleccionando através de uma revista, pacientemente, a um euro cada um] e o tacho que sobrou de um conjunto cá de casa, que vejo o meu futuro. Ali guardado, no lugar mais improvável, à espera de oportunidade.
A minha avó também guardou panos novos de cozinha na sua casa. Casa esta que deixou, para vir cuidar das netas. Estes paninhos ficaram à sua espera, enquanto ela nos via crescer na nossa casa. Enquanto ela adiava o seu sonho de voltar para o seu espaço e dedicar-se a ela própria. Sonho que nunca chegou a realizar-se, porque a vida tem destas coisas.
Fecho o baú. Decido que vou utilizar estas coisas. Que vou ter o meu cantinho, e que não vai demorar tanto quanto parece.
Porque o trabalho vai aparecer. E eu vou agarrar-me a ele com unhas e dentes, vendo o meu bauzinho ao fundo.

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