Carta de amor

"Quem olha para ela, assim de longe, nunca adivinharia. Nem eu, que a conheço há pelo menos 8 anos, 7 dos quais intimamente, diria tal coisa.
É incrível, como num ser tão pequenino consegue caber tanta dor. Por vezes, quando a vejo assim, penso que ela não vai aguentar. Chora com uma tal sofreguidão que a imagino como uma ponte prestes a perder-se das margens, desmoronando-se inevitavelmente.
Mas curiosamente, é nos momentos em que a vejo sofrer que dou por mim a ser mais ponderado e tranquilo. Deparar-me com a sua dor é como um choque directo no coração, que me obriga a reagir para a tranquilizar o mais depressa possível. Não suporto vê-la assim, apesar de saber que não me cabe a culpa. Sei que o seu maior inimigo é também a única pessoa com quem pode verdadeiramente contar para se salvar: ela própria.
Não imagino o que seja termos de lutar contra nós próprios. Mas vejo-a travar essa batalha diariamente, confrontando-se com diferentes "eus". Vejo-a encontrar obstáculos insignificantes e achar sempre que são maiores do que ela. Vejo-a debater-se para trepar e continuar em frente. Dá muitos passos atrás. Perde-se constantemente. E no entanto, de quando em vez dá um passo certeiro que não volta a retirar.
Desejava que ela visse em si própria a beleza que eu vejo; mas ela encontra apenas sombras. Fragmentos do que poderia valer a pena... e ao mesmo tempo, eu começo a dar-lhe razão. Porque o sol que ela era - a minha luz, a minha alegria - vai-se desvanecendo, enquanto ela se vai perdendo de si própria... a exaustão começa a instalar-se e a dar sinais no seu rosto que era antes de menina.
Vejo-lhe o desespero de quem não tem armas às quais se agarrar; que fazer quando as nossas mãos, o nosso corpo se voltam contra nós? Deixando de os controlar, deixando de ser donos de nós mesmos, entregamo-nos à solidão.
Embora passe cada momento que consigo com ela, dando-lhe amor e suporte, vejo essa solidão nos seus olhos e dói-me. Sei que ela tem de passar por isto em certa medida sozinha, mas é assustadora a forma como nos sentimos impotentes ao assistir e não poder fazer mais.
Vejo-a errante e confusa, assustada como um animal enjaulado... depois tento olhá-la nos olhos e vejo culpa - ela desvia o olhar de mim como se não fosse merecedora disso. Um constante carregar do mundo inteiro... porque esta mesma coisinha pequenina e frágil, que eu amo tanto, tem ao mesmo tempo uma força imensa.
Amo-a tanto... já não estaria aqui se assim não fosse. E no meio da confusão que é a minha vida, ela é o única coisa que eu sei que quero manter no meu futuro... gostava que ela sentisse isso... gostava que se agarrasse a isso e lutasse. Mas que lutasse por ela, por se aceitar, amar e perdoar. E que me desse mais vezes o maior prazer que tenho na vida: vê-la sorrir."

Comentários

Indio disse…
:´) Parece que me les os pensamentos...

Mensagens populares deste blogue

Aluga-se cantinho onde poder chorar

Longe do mundo... mas perto de ti!

E hoje é só.