Não sei quando me perdi...

Não sei quando foi que me perdi, na minha vida, de mim própria. Não sei quando foi que o meu corpo aprendeu a rejeitar-se, que deixei de conhecer a orientação para os meus próprios passos. Não sei também quando deixei de ter vontade de olhar para mim própria. Ou onde deixei a vontade de sorrir... Sei que hoje dou por mim a procurar mapas para um sítio que aprendi a desconhecer: a minha própria paz.
Sinto-me encurralada. À minha frente, está a caixa de Pandora, que agora se abre e desvela coisas enegrecidas, distorcidas e contorcidas saindo de dentro de mim. Dizem que a terapia é isso mesmo; uma espécie de purga. Assim me sinto, purgando a toda a hora, em pesadelos complexos e confusos, em todas as horas acordadas do dia, onde sou abalroada por comboios de pensamentos dolorosos, duvidosos e inseguros sobre mim, sobre as minhas acções.
Continuando esta interessante metáfora, sou encostada à parede, de ambos os lados, pelas relações que se complicam, desligam e colidem. Sinto, em todos os casos, culpa. Por não ter paciência para ouvir, por explodir na menor contradição, por desejar chorar na mais pequena frustração. Por desejar fugir de coisas novas que me possam magoar mais. De novo, e cada vez mais, criança?
Afugento as amigas, que querem aproximar-se, porque não suporto a ideia de que tornem a ir embora. Não consigo sentir-me segura na sua presença, como se a qualquer momento surgisse uma nova traição.
Medo de que me fujas, M., farto de esperar por dias mais solarengos. Porque não é bonito ver uma pessoa que se ama a desejar destruir-se. Ou a destruir-se efectivamente, aos bocadinhos. Dou por mim a procurar rostos de outras mulheres, achando que aquela ali, que sorri muito, que é bonita, essa sim poderia fazer-te feliz. Não eu... Porque eu, em vez de sorrisos tenho lágrimas constantes, fáceis e inadequadas. Em vez de beijos repenicados, devolvo necessidade de atenção e de mimo a toda a hora. Como disse, novamente criança, e desta feita insegura...
Por trás de mim está a parede. O muro de quem sou, que só é forte na hora de me aprisionar, na hora de ser inflexível comigo e com os meus. Mas é feio e nada tem a ver com aquilo que eu sonhava ser...

Saudades desses dias, que nunca mais chegam. Em que eu hei-de ser padrão étnico em calças largas de pano, a ir buscar o pão, a perder tempo com as ervas aromáticas na pequena varanda e a ir correr, ou andar de bicicleta, ou passear o cão, ou ambas as coisas. Saudades desses dias em que sou livre de decidir o meu dia, o meu ritmo e o meu espaço. Que ocuparei com pouco, ou com muito menos do que até agora. Porque sou feliz assim.
Saudades dos dias que, temo agora, talvez nunca cheguem, em que partilharemos o sofá, , M., e os dias. Em que a espontaneidade faça parte das nossas rotinas, ainda que respeitando um espaço individual que, hoje reconheço, também a mim me faz falta. Em que poderemos fazer amor quando nos apetecer e não quando der; em que iremos adormecer juntos a ver as nossas séries. Em que cozinharemos um para o outro, ou para os amigos, e que dançaremos abraçados num momento inesperado de ternura. No nosso espaço, no nosso tempo...
Saudades de dias que choro, porque acho que não vão chegar... em que eu vou ser capaz de verbalizar na aula de yoga, com sinceridade, as simples palavras "Eu amo-me. Eu estou em paz comigo. Eu perdoo-me."... palavras que não consigo pronunciar porque são mentiras e cuspi-las-ia se as pronunciasse.
Saudades de rir, de sorrir. De estar bem comigo... porque sim, porque é o que vem antes de tudo o resto. Antes do amor, antes da amizade, antes dos outros. Deveria vir eu...
Não sei quando me perdi... mas gostava de me encontrar...

Comentários

Indio disse…
Tu és uma pessoa forte apesar de não acreditares nisso neste momento.

Vai ser difícil e se calhar mesmo doloroso mas vais passar por essa tempestade cheia de escuridão e raios a baterem em ti... um dia vais estar ao sol a rir-te e em paz contigo própria.

Não desistas!! eu sei que és capaz e vou estar aqui sempre com a mão estendida.

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