Momento pessoal. Escutem e guardem...

Vou escrevendo sobre tudos e nadas. Coisas grandes, pequenas coisas, significados e insignificâncias. Porque me acalma, porque me ajuda a debater as coisas dentro de mim. Porque preciso de escrever, ou porque simplesmente me dá prazer.

Mas sobre este assunto, passados meses, não tinha ainda conseguido escrever. Como se ainda não tivesse conseguido reunir fôlego para tal. Como se fosse uma ferida tão grande e sensível, que qualquer abordagem escrita ao tema me iria derrubar de vez. Era um assunto monstro demais, grande demais dentro de mim, e a simples ideia de pôr luz sobre ele dava-me pânico, até hoje.

Falo do dia em que perdi uma grande amizade.

Percebo agora que quando um amigo nos desilude, nos magoa derradeiramente, a dor que fica não é mais aguda, acutilante ou destruidora do que a de uma desilusão com um grande amor.

Mas para mim tem sido, verdadeiramente, muito mais difícil de gerir, de ultrapassar, de esquecer. Tem sido uma dor muito mais constante, um espinho cravado que de vez em quando relembra que ainda não consigo respirar.

Sou mulher de homens. Sinto-me melhor entre eles, porque posso ser eu mesma. Frontal, desbocada, descontraída. Rodeada de mulheres sinto-me herdeira do famoso espartilho, que me obriga a estar sempre em pose, a preocupar-me sempre mais com o que digo, e a estar atenta às facadas constantes que as mulheres, por competição que faz parte da sua natureza, aprendi, acabam sempre por nos desferir. Salvo raras e felizes excepções.

Mas tinha uma amiga. E hoje olho para trás em reflexão e apercebo-me do pilar que ela era para mim. Da mão estendida, farol, luz constante na minha vida, ao longo de tantos anos. E eu sei que para ela fui igual ou maior força. A minha auto-estima deixa-me, apesar de tudo, ver a pessoa importante que fui para alguém.

Mas as pessoas mudam. Ela mudou radicalmente. Certamente eu também mudei. E aos poucos fui deixando de conhecer esta pessoa. Que se transformou numa sombra fútil e falsa da ternura que em tempos a caracterizou. Afastou-se de mim para viver opções errantes, infelizes e vergonhosas. E embora eu tentasse fazê-la voltar para mim, para nós, seu grupo de amigos, eu percebi muito tempo antes que a tinha perdido.

A pessoa que eu adorava morreu. No seu lugar ficou uma triste e amarga figura, distorcida pela fraqueza psicológica, pela falsidade e pela mentira. Posso dizer-vos sem vitimizações que me revoltei contra esta personagem na minha vida. Não a suportava. E afastei-me dela, porque já não me dizia nada.

E num dia, depois de um reboliço de desilusões, fiquei a conhecer o monstro por detrás desta pessoa. Questiono-me se nunca o vi e já lá estava. Ou se foi a vida que o criou.

Mentiras umas atrás das outras, olhares furiosos que não correspondiam às palavras doces. Mentia-me! Dizia-me algo que todo o seu corpo e a sua expressão desmentiam.

Eu estudo pessoas, esse é o meu trabalho. E penso que foi isso que me alertou para a existência desta personagem nova antes dos outros. E um dia confirmou-se à luz do dia tudo aquilo que eu há muito alertava que iria encontrar-se.

Resumindo e concluíndo, acabei com uma amizade. Não sabia sequer que isto era possível. Mas tive de me afastar desta pessoa que já só me consumia, desgastava, enganava. Já não gostava de mim e já há muito que não queria verdadeiramente saber de mim. Deixou um rasto de destruição que ficou muito tempo depois da sua partida.

Só a vi uma vez mais. E fugi dela como uma criança de cinco anos que se esconde na cama dos pais, com medo dos bichos debaixo da cama. O pânico tomou-me...

Hoje, vivo sozinha de amigas íntimas. Converso, gosto. Mas não me aproximo demais. Vou-me apercebendo, quando o companheiro fica assoberbado com os meus desabafos, de que precisava dela. Vai-me doendo quando oiço o seu nome. De vez em quando ainda choro.

Conclusão: a desilusão verdadeira de um amigo inscreve uma dor no coração que, estou convencida, não se compara à de um amor. Já passei pelas duas e posso garantir: quero continuar a amar, mas não sei se quero voltar a ter uma amiga assim...

Comentários

polegar disse…
doa o que doer, quando chegamos a uma parede, não vale a pena continuar a empurrar. temos de nos proteger. há esse ponto. é triste e ficamos desolados, sentimo-nos culpados. faz parte. mas temos de dar o passo.
quanto a novas amizades, és demasiado generosa para não descobrires que o coração devagarinho vai deixando entrar quem merece... porque há sempre quem valha a pena ;)
Option disse…
Longe estou de ser teu intímo, mas considero-me teu amigo.
Já passei por uma situação semelhante embora talvez não tão intensa.

Na altura fiquei muito mal mas, ao contrario de ti, senti a necessidade de falar com os meus amigos mais chegados. Falei sobre alguém que eles nunca conheceram, que não era "alguém" para nenhum deles.

Esses meus amigos ainda hoje estão juntos de mim, embora um no Algarve, outro em Lisboa e eu no Porto. São esses que contam!

Sublinho o que dizes, foi uma das piores "sensações" que tive e não quero voltar a repetir. E gostaria que ninguém a quem estimo tivesse que o sentir também.


Posso não comentar o teu blog, mas quero que saibas que volta e meia dou o cheirinho da minha graça.

=D
Nana disse…
Descrição Profunda! Quando conversamos, não imaginei que te sentisses de outra forma... é assim que imaginava o teu coração neste momento.
Gosto de acreditar que nada na vida é por acaso, e que as coisas menos boas da nossa vida têm lições muito importantes para nós.
O teu coração é muito grande, talvez demasiado grande, e permite-te sofrer demasiado. Esta protecção que agora sentes pode ser muito importante para ti, pode ajudar-te em várias áreas da tua vida.
Mas a verdade, tal como em qualquer perda, é que dói, e dói muito, e não há nada (ou quase nada) que possamos dizer que cure a tua ferida. E usando o cliché mais usado: o tempo cura tudo. E daqui a uns tempos estarás novamente radiante, com uma cicatriz, mas radiante. E nesta luz e brilho que te caracterizam, vais encontrar e permitir que a amizade te encontre; talvez desta vez numa medida mais certa para as tuas medidas, numas condições mais condicionadas para ti - uma amizade que preencha os teus pontos vazios e não que te elimine os teus pontos fortes.
Apesar de poder não preencher estes requisitos ;) sempre que quiseres e sentires necessidade, sabes que podes falar desabafar ou chorar até.
Beijinhos grandes com sdds

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