Desabafo a quem queira ouvir

O corpo inclina-se para trás, as costas ficam arqueadas, duas pequenas curvas de músculo formam-se sob as omoplatas, e as pernas esticadas impulsionam todo o corpo para trás como uma mola que se dobra de forma perfeita. A silhueta desta mulher em contra-luz parece um sonho, sentimos a inegável beleza das curvas de uma mulher a impelir-nos como um soco no estômago, porque percebemos que parámos de respirar. Como se observar algo tão belo e absorver ar fossem duas tarefas impossíveis de serem realizadas ao mesmo tempo. Ou como se simplesmente nos esquecêssemos....
E num salto ela voa. Está no ar, quase parando o tempo à sua volta, para ser apreciada na sua façanha simetricamente perfeita, de execução irrepreensível.
Acho que é esta sensação de sufoco que imagino, quando penso em estar num palco. Quando me imagino dona de uma voz que faça parar o ar que circula, que descaia a boca de muitos surpresos, que arrepie a maioria e que faça chorar os amados.
Imagino os olhos fechados num apertado sorriso, a denotar o prazer enorme em deixar fluir essa maravilhosa flauta natural, que se espalha pela sala. A saborear cada palavra, cantando-a com a boca inteiramente rasgada num sorriso.
Porque uma voz bonita é magia, que arrepia a nuca e faz sonhar, sem sequer precisar de acompanhamento. Música começa na voz que nos arrebata, que nos abraça e que nos faz estalar contra a parede. Uma voz forte mas que nos embala.
Ao ver o sol partir, fico a imaginar que é o meu holofote, e que nesse momento, pelo menos por uma vez, serei olhada de cima, deixando os rostos sem noção de horas nem de dias, encantados pelo feitiço de uma voz que me sai natural e cheia de cor, apagando as dores, criando sorrisos orgulhosos e fazendo o coração doer, de tão preenchido.

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