Até onde vai a extravagância de uma alma?
Chega esta altura do ano, e eu sinto formigueiros. A pele dorida, escondida o ano todo, arde-me encostada à roupa. Pede-me luz. Pede-me espaço. Os pés deliciam-se com a liberdade que o calor lhes traz. Resmungam imediatamente, se eu tentar encarcerá-los nuns ténis. Só estão felizes de cara encostada ao chão fresco de casa. Ou melhor ainda, no chão do estúdio, "mascarrados" e a dançar até estarem, como hoje, repletos de nódoas negras. Mas livres. A pele está branca e pede-me sol. As feridas das mãos pedem-me o sal do mar. As convenções sociais exigem que só mostre o corpo quando estiver livre de pêlos. Mas todo o meu corpo deseja incondicionalmente um pedaço de sol. Como o espanta-espíritos no alpendre, que aguarda mudo que o vento chegue, para lhe devolver a vida por instantes. Não sabe dançar sozinho... mas tem as sapatilhas prontas e a voz afinada... dentro dele guarda a ternura de uma melodia, que só espera ser tocada. Até onde vai a extravagância de uma alma? Pés ...